14 outubro 2013

A BIENAL DE CORUCHE

A escassas   horas do seu encerramento, visitei a bienal de artes plásticas de Coruche.
Desde 2003, creio que não devo ter «falhado» mais do que duas exposições e delas sempre tenho trazido um sentimento de gratidão.
Ver arte faz bem ao espírito, alarga-o, oferece-lhe harmonia, ou desarmonia, provoca interrogações, leva à descoberta de outras abordagens de um tema ou à imaginativa utilização dos materiais.
Toda a interação entre os objetos expostos e quem os olha não é inócua nem vã, pois deixa sempre uma marca, qualquer que ela seja, dure o tempo que durar. É por causa dessa marca que me sinto grata.
Ver arte é mais do que uma viagem de observação; é uma migração até ao continente do desassossego interior, onde só podemos permanecer enquanto o estremecimento o consentir.

Este ano, Coruche deu destaque à escultura e à instalação. Pintura, cerâmica, trabalhos em madeira de menor dimensão, ocuparam uma sala, em formato clássico e bem comportado.
Denominada «Percursos com Arte», a bienal usou o espaço público e levou os visitantes a percorrerem as ruas do centro histórico, limpíssimas, floridas e bem pavimentadas.
Como os tempos que vivemos são de recessão económica, uma parte significativa do comércio local fechou portas. Então, algumas das montras e interiores das lojas tornaram-se o cenário para que os artistas, reconfigurando o espaço, mostrassem as suas peças; outras peças/instalações exibiram-se ao ar livre nas ruas, praças e jardins, em diálogo com a envolvente natural ou edificada.

O catálogo é elucidativo quanto às notas biográficas dos artistas e respetivos percursos. Não esquece, porém, os contributos de firmas e instituições que ajudaram a erguer a bienal. Entre as últimas, destaco os Centros de Dia e as Associações Seniores do
concelho.
Se aos artistas se pede que estabeleçam os conceitos para as suas criações – já Leonardo da Vince escrevia que «a arte é coisa mental» - os artesãos, no ativo ou retirados pela sua idade, detêm saberes de muita valia que a sociedade não pode, nem deve, deixar de aproveitar.
E, porque o catálogo também tece agradecimentos às Creches e Jardins de Infância, não posso deixar passar em claro a ideia que me parece subjacente a esta mostra: os «percursos com arte» não são só percursos no espaço mas, igualmente, percursos no tempo, inter-geracionais, em que uns dão o solo estável da experiência, e, outros, dão o ar e o fogo da irrequietude, próprios dos mais jovens.
Quanto à arte, não escolhe geografias nem tempos porque é o falar da alma.
 
Maria Amélia Timóteo
Texto publicado no jornal da S. C. M. do Cartaxo.

CORUCHE - O ENTARDECER