21 julho 2014

CICLISMO


Homenagem aos Ciclistas do Concelho do Cartaxo
Terminou o campeonato mundial de futebol, o acontecimento máximo da modalidade que congrega mais adeptos em todo o mundo. À volta desse encontro de escala global, movem-se negócios de muitos milhões: as transmissões dos jogos, via rádio e via TV, a hotelaria e a restauração,  os transportes, o merchandising – bandeiras, cachecóis, barretes, entre outras representações icónicas do desporto, elevado a religião, isto sem falar dos honorários dos jogadores e dos técnicos, valores que roçam o despudor, arremessados ao rosto de uma sociedade empobrecida.
Tudo gera dinheiro, a economia agita-se e cria algum emprego temporário. Depois, vem o fim da festa, o desarmar da feira. Que fica, como lucro real, para o país organizador? Que benefícios colhe do «apanhar das canas»? Não saberemos nada de tais contas. Esses números, ainda que sejam publicados, não terão quem os analise ou os contradiga.

Já lá vai o mundial de futebol de 2014 e, com ele, o linguajar futebolês (deveria ter anotado uma meia dúzia de termos que me poderiam valer umas quantas crónicas!) patente nos relatos, nos comentários nas repetições – numerosas e despropositadas – dos jogos, nas previsões dos «oráculos» credenciados para os augúrios. O futebolês é um falar diferente, um dialecto, recheado de expressões novinhas em folha, criativas algumas, adaptadas ou recicladas, outras, mas sempre muito vivas e empolgadas, proferidas com a seriedade e a convicção que mereceriam temas como as guerras e atentados que sangram o mundo, ou a fome que mata, ou as mulheres e crianças assassinadas, silenciosamente, tão silenciosamente que nem para as estatísticas contam.
Deixemos o mundial entrar no limbo, até à próxima edição.

Temos, agora, a decorrer duas modalidades desportivas em que os portugueses costumam a alcançar excelentes resultados, com ou sem pódium: o hóquei em patins, quase a terminar, com mérito para os lusitanos, e o Tour de France, prova na qual, de há muitos anos a esta parte, os portugueses marcam presença e ganham prémios.
Fala-se muito destes desportos na comunicação social? Não me parece. Diz-se o mínimo, mostra-se o mínimo, passa-se à frente para assuntos com mais polpa e sumo, como seja a compra e a venda de jogadores de…futebol.

No Tour deste ano,  participa, entre outros portugueses de coragem e valor, um rapaz simples e risonho, sem vedetismos, e que usa um nome também português: Rui Costa. Quem é? Pois é, nem mais nem menos, que o campeão mundial de ciclismo. Pedala com garra, defende a camisola que veste, como lhe compete. Ainda não vi – mas eu não sou lá muito atenta a essas coisas – bonés, óculos, cachecóis, luvas, camisolas, com o seu nome ou, pelo menos, com o seu nome associado ao logótipo da equipa pela qual corre. O moço merce destaque e o ciclismo também, tal como outras disciplinas esquecidas que educam o corpo e ajudam a formar o caráter.
Tenho muito respeito pelo desporto, em geral. Os gregos, educadores natos, praticavam modalidades que ainda hoje se mantêm vivas. As que acima citei, mais modernas, aproveitaram os avanços técnicos que foram surgindo. Desde criança que aprecio particularmente o ciclismo, talvez por ser cartaxense, da terra de ilustres ciclistas, talvez por ter conhecido um deles que, tendo real valor, mantinha a sua oficina de consertos de bicicletas. Era o seu ofício e nele trabalhava, no passeio fronteiro à sua casa.

Os tempos eram outros. O maior valor em jogo era, então, o desporto pelo desporto. Suponho que terá sido esse o valor que José Maria Nicolau, e os da sua geração, colocou mais alto, ainda que as taças, placas e medalhas ganhas lhe enchessem uma sala.  
Maria Amélia de Vasconcelos
Texto publicado no jornal da S. C. M. do Cartaxo.