13 janeiro 2014

CANDEIA

No começo de cada ano, quando se formulam os votos de saúde, paz e prosperidade para a ronda dos 365 dias, parece-me que ficará bem falar de luz: a luz do pensamento, do discernimento, a luz do olhar que nos permite fazer as escolhas e as rejeições, a luz da inspiração, se pensarmos nos atos criativos das artes e das ciências. Precisamos de luz, apenas três letras, palavra curta, rápida de proferir, plena de significados, decisiva nas nossas existências.
Agora que a energia elétrica permite que se faça luz tocando num simples botão, custa imaginar a vida dos tempos antigos, sem os recursos da modernidade.
Os romanos e os outros povos do Mediterrâneo, usavam, para a iluminação, a candeia, ou lucerna, objeto de barro liso ou decorado onde o azeite, impregnando o pavio, se ia consumindo para afastar as trevas.
A palavra candeia vem diretamente do latim, com poucas alterações, como, aliás, muitas outras que usamos. Já candil, que é uma lanterna suspensa, é uma palavra de origem árabe. A função é a mesma: iluminar. O óleo usado também é o mesmo: o azeite. A diferença é que a pequena candeia tem uma pega e pode levar-se na mão para onde se quer, enquanto o candil é pesado e ilumina, com vários pavios, a partir do alto, um compartimento de uma casa. Uma e outro usam-se, ainda, nalguns países do norte de África e do próximo Oriente. Nos templos católicos, o lampadário que indica a presença do divino, é alimentado a azeite.
A oliveira é a mãe deste produto que tem tão vastas aplicações. O fruto é consumido como tal, com geral agrado. Espremido, obtem-se o azeite que é luz, alimento, remédio para dores, bálsamo para feridas, matéria-prima para as indústrias de saboaria e de cosmética. A árvore pode viver séculos, sempre  produtiva. Em Maio, cobre-se de uma flor miudinha, branca, a que, em Portugal, chamamos candeio, como que a lembrar a candeia na qual o óleo a haver será consumido.
O ciclo do azeite inicia-se a meio do inverno, com a prova do azeite novo, da azeitona que foi colhida no final do outono/princípio do inverno. É por essa altura – 2 de Fevereiro – que se celebra o dia de Nossa Senhora das Candeias ( a Candelária, no Brasil), ou Nossa Senhora da Purificação ou, ainda, Nossa Senhora da Luz, culto que foi difundido em Portugal a partir do século XV. A data deste culto à Virgem é fixa, quarenta dias após o nascimento de Jesus, quando as mulheres que tinham dado à luz um varão deveriam acorrer ao templo de Jerusalém para serem purificadas, imolando um animal macho. Maria cumpriu também o costume judaico de ser purificada e de apresentar o Menino no templo e é esse episódio em que se realça a luz do que é puro que se comemora, do ponto de vista religioso, a 2 de Fevereiro. Por causa desta memória, quer a tradição que, nesse dia, nos lares, se frite qualquer alimento, sendo as filhós o alimento/gulodice mais comum. Não sei se o costume se mantem, mas lembro-me, de vez em quando, das filhós da minha meninice, salpicadas de açúcar e canela.
E, como o que é popular tem sempre raízes longínquas às quais vai beber, também o tempo atmosférico se liga a esta ocasião. «Lê-se» o tempo, no seguinte provérbio:
Se Nossa Senhora das Candeias rir (sol, luz), está o inverno para vir; se Nossa Senhora das Candeias chorar (chuva), está o inverno a passar.

Votos de um ano de muita luz para os leitores; que cada um mantenha acesa a sua candeia.

Maria Amélia Timóteo
Texto publicado no jornal da S. C. M. do Cartaxo.

MÉRIDA - ESPANHA


ALEGRIA

Há épocas do ano em que é quase obrigatório, ou, pelo menos, de bom tom, socialmente falando, afivelar uma máscara, forma de nos irmanarmos nos gestos, nos sentimentos, nas emoções. Assim, quando vamos de férias convém mostrar entusiasmo pela mudança de cenário e pela apetência do descanso, sempre merecido. Quando chega o Carnaval, a máscara é faceira, divertida, na perspetiva de vivermos umas horas em que, se nos apetecer, nos poderemos «virar do avesso» sem o risco de que nos colem o rótulo de doidinhos varridos. Há as máscaras para casamentos, batizados, inaugurações, sessões solenes, máscaras para todas as circunstâncias que o mundo nos impõe e das quais, de bom ou mau grado, temos de nos revestir.

O Natal dos nossos dias é decorativo, com muitos brilhos, cores vistosas, invenções diferentes cada ano. Salta das montras paras as ruas, recobre as fachadas, entra-nos em casa pela caixa do correio, com propostas de compras, e, sobretudo, é-nos lautamente servido pela televisão: palavras, música e imagens muito apelativas ao consumo. Contudo, parece-me que, nestes primeiros anos do século XXI, estará menos espalhafatoso do que já foi, relativamente aos anos 80 e 90 do século passado; ou, então, andará mais sofisticado, seguindo os ditames da moda que valorizam a sobriedade.

Com ou sem derivas de ornamentos, o Natal celebra a vida. O nascimento de uma criança é sempre um acontecimento modificador, mesmo quando essa criança, pelas mais diversas razões, não é desejada; tudo muda na família quando um novo membro se apresenta. Que sentimentos desperta? Que necessidades reclama ver satisfeitas? Que caminho de vida será o seu?

Tratando-se do Natal de Jesus, as profecias antigas foram, passo a passo, cumpridas. Para quem crê, a Sua missão salvítica é esperança para o mundo, que o mesmo é dizer, alegria, não só a alegria fugaz de um momento, ainda que especial, mas a alegria fundada e plena, aquela alegria que rompe, mesmo através de um pequeno rasgo num manto de tristeza ou de indiferença. A força dessa alegria, capaz de trespassar a mais densa mágoa ou o mais duro gelo, vale como um tesouro que precisamos de conservar para o distribuirmos quando desejamos a alguém «Feliz Natal». Com todas as luzes artificiais, prendas e abundância sobre a mesa, pode comemorar-se a quadra natalícia, mas fica por cumprir o Natal, porque falta a chama que é o dom da alegria interior.

Que cada um de nós deixe vir ao de cima essa luz que nos foi concedida para poder desejar a todos um Santo Natal.

Maria Amélia Timóteo
Texto publicado no jornal da S. C. M. do Cartaxo.