12 outubro 2014

TOPONÍMIA

Um objecto e o nome pelo qual o mesmo é conhecido partem de necessidades diversas, porém inseparáveis. O nome surge depois, para definir o objecto, no seio do universo de falantes da mesma língua; acrescentar-lhe o que seja, pode torná-lo um pleonasmo, por vezes anedótico.

O nome atribuído a um local forma-se, frequentemente, a partir das condições naturais desse mesmo local, quer se trate de um monte, de um vale ou cova, de um rio ou riacho, de uma floresta ou de uma árvore. Na nossa língua, muitas localidades devem  a sua designação à respectiva situação geográfica, o lugar onde, por comodidade ou por defesa contra inimigos, se agregou o primitivo núcleo populacional. Também é comum encontrarmos, em Portugal, povoações cujos nomes radicam em equipamentos atribuídos a habitantes mais remotos. É o caso de designações como: ponte, moinho, castelo, torre, porto, vila, e tantos outros.

No traçado interno das povoações – ruas, travessas, becos, escadas – a necessidade de marcar com um nome o sítio de residência, ou de um qualquer prédio, é evidente. O mais comum, modernamente, é dar a esses elos da malha urbana nomes de personalidades relevantes, nomes de outros países ou das suas capitais ou datas importantes na História nacional ou local.

É um estudo interessante verificarmos, numa povoação, a permanência ou a alteração da toponímia, num determinado período.

Nos assentos paroquiais do Cartaxo do último quartel do século XIX – consultados em razão de outras pesquisas – encontrei nomes de arruamentos que ainda se mantêm. O adro da igreja paroquial, em 1877, era, indiferentemente, designado por «adro» ou por «praça de São João Batista», hoje Largo de São João Batista. É abundante a alusão à rua de São Sebastião, à Ribeira (já não «Cartaxinho»), ao Valverde – território extenso onde havia vinhas e olivais - , ao Gil, ao Algar, à Boavista, à rua Velha, entre outros locais que ainda são conhecidos pelos nomes, a par de outros, os oficiais. No espaço alargado do Valverde, cortado por várias artérias, houve que encontrar uma toponímia que as identificasse nos nossos tempos.

Pela análise dos assentos paroquiais, descobrimos algumas das atuais ruas, agora «rebatizadas», cujos antigos nomes alguns ainda recordarão. Como exemplos, vejamos os que se seguem: rua do Carril / rua Serpa Pinto; rua d’Além / rua José Ribeiro da Costa; rua Direita / rua Mouzinho de Albuquerque; rua do Jogo de Baixo / rua Dr. Júlio Montez; rua dos Casais / rua 5 de Outubro; rua da Carreira / rua Batalhoz. Também há referências à Praça Nova que, presumo, será a atual Praça 15 de Dezembro, a qual todos os cartaxenses conhecem como «Largo da Praça» ou, simplesmente, «Largo».

Entre os nomes que não mudaram nestes quase cento e cinquenta anos, destaco a travessa do Nogueira, a travessa do Gil, a rua (?) das Palhoças e a rua (?) do Cardador, para além da já citada rua de São Sebastião, onde existiu a capela de estilo manuelino, de evocação deste Santo protetor dos leprosos, na saída do Cartaxo em direção de Santarém.

Não me é possível localizar, no atual traçado urbano do Cartaxo, o casal do Barbosa nem o casal da «Gocharia». O mesmo se passa com a travessa dos Sapos e…imagine-se, a rua das Malucas! Em tais sítios, de nomes tão pouco apresentáveis, nasceram, tiveram morada ou faleceram, em tempos não muito recuados, cidadãos cartaxenses.

Quando, com a República, foi criado o Registo Civil, não custa a crer que esses cidadãos sentissem algum incómodo ao terem de declarar a morada.

Ou porque a toponímia mudou, ou porque se destruíram caminhos para dar lugar a ruas, o certo é que, que me conste, tais denominações desapareceram. Quem delas, hoje, se lembrará? Contudo, são História e, como tal, vo-las entrego.
Maria Amélia de Vasconcelos
Texto publicado no jornal da S. C. M. do Cartaxo.

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